Pesquisadores avaliam ação antimicrobiana de planta da Serra da Mantiqueira

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Professores da UNIFAL-MG colaboraram com estudo realizado pela Federal de São Paulo

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) divulgou nesta quarta-feira, 29/01, reportagem sobre uma planta encontrada na região da Serra da Mantiqueira, que tem propriedades anti-inflamatória, antimicrobiana e antiparasitária. A matéria "Planta da Serra da Mantiqueira tem composto com ação anti-inflamatória", assinada por Elton Alisson, destaca a colaboração dos pesquisadores do Instituto de Química da UNIFAL-MG, professores Antonio Carlos Doriguetto e Marisi Gomes Soares, que ajudaram a avaliar a ação microbiana do composto bioativo estudado por um grupo de pesquisadores do Instituto de Ciências Ambientais, Químicas e Farmacêuticas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

De acordo com a pesquisa realizada pelos professores da Universidade, a substância apresenta forte atividade antifúngica contra as leveduras patogênicas e pode ser considerada como um protótipo pela indústria farmacêutica para o desenvolvimento de agentes antifúngicos mais eficazes.

Leia na íntegra reportagem divulgada pela Agência FAPESP:

Planta da Serra da Mantiqueira tem composto com ação anti-inflamatória
29 de janeiro de 2015

Por Elton Alisson

Agência FAPESP – Pesquisadores do Instituto de Ciências Ambientais, Químicas e Farmacêuticas da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) isolaram e caracterizaram um composto bioativo de uma planta encontrada na região da Serra da Mantiqueira que tem propriedades anti-inflamatória, antimicrobiana e antiparasitária.

O composto, denominado sakuranetina, foi identificado durante um projeto realizado com apoio da FAPESP, na modalidade Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes.

“Observamos que a atividade anti-inflamatória da sakuranetina é muito similar à da dexametasona, o principal corticoide usado hoje no tratamento de processos alérgicos e inflamatórios graves”, disse João Henrique Ghilardi Lago, professor da Unifesp e coordenador do projeto, à Agência FAPESP.

A sakuranetina foi isolada da planta Baccharis retusa DC., da família Asteraceae, a mesma do girassol (Helianthus annuus) e de diversas outras plantas medicinais.

Segundo o pesquisador, o gênero Baccharis – um dos mais importantes da família Asteraceae, composto por cerca de 500 espécies de plantas, entre elas a carqueja (Baccharis trimera) – é muito comum nas Américas do Sul e Central, em regiões de altitude como a Serra da Mantiqueira, a cadeia montanhosa que se estende pelos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.

Ao prospectar espécies vegetais com compostos bioativos de interesse farmacológico em montanhas em Campos do Jordão (SP), os pesquisadores constataram que há uma grande variedade de espécies de Baccharis na região, a mais elevada da Serra da Mantiqueira, com 1.628 metros de altitude.

“Ficamos surpresos com a variedade de espécies de Baccharis na Serra da Mantiqueira”, afirmou Lago. “Coletamos cerca de dez espécies diferentes em Campos do Jordão, entre elas a Baccharis retusa DC..”

A fim de selecionar as que apresentavam potencial atividade biológica, os pesquisadores prepararam extratos bioativos das plantas coletadas e os submeteram a uma sequência de testes em laboratório.

Os resultados indicaram que o extrato da Baccharis retusa DC. demonstrou maior atividade antiparasitária, antimicrobiana e anti-inflamatória em comparação com as outras espécies coletadas.

Com base nessa constatação, os pesquisadores analisaram o extrato da Baccharis retusa DC. por cromatografia líquida de alta eficiência e por ressonância magnética nuclear, a fim de determinar a composição química da planta.

A análise química revelou que cerca de 50% do extrato bruto da planta diluído em etanol é composto por uma única substância: a sakuranetina. “Isso é muito raro em plantas porque, em geral, elas apresentam uma grande diversidade de compostos”, afirmou Lago.

Os pesquisadores depois fracionaram o extrato bruto da planta e constataram que a substância ativa da planta era a sakuranetina .

“O fato de cerca de 50% do extrato bruto da Baccharis retusa DC. ser composto pela sakuranetina facilitou muito isolarmos esse composto que é um flavonoide [do grupo dos polifenois encontrado em diversos tipos de vegetais e de alimentos, que trazem benefícios à saúde”, disse Lago.

“É muito raro na área da química de produtos naturais obter uma quantidade tão grande de uma substância, da ordem de gramas, como a sakuranetina de Baccharis retusa DC.”, afirmou.

Atividade antiparasitária

A fim de avaliar a atividade antiparasitária da sakuranetina, os pesquisadores da Unifesp, em parceria com André Tempone, do Instituto Adolfo Lutz, Rodrigo Cunha, da Universidade Federal do ABC (UFABC), e Paulette Romoff, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, isolaram e testaram o composto. Eles incluíram dois derivados semissintéticos dele (que passaram por simples modificações estruturais) em formas promastigotas (flageladas) e amastigotas (intracelular) de Leishmania spp – parasita causador da leishmaniose – e amastigota e tripomastigota (sem flagelo) de Trypanosoma cruzi – protozoário causador da doença de Chagas.

Os resultados indicaram que a sakuranetina apresentou atividade antiparasitária contra Leishmania (L.) amazonensis, Leishmania (V.) braziliensis, Leishmania (L.) major e Leishmania (L.) chagasi em concentrações na faixa de 43 a 52 microgramas por mililitro (ug/ml) e em 20,17 ug/ml contra tripomastigotas de Trypanosoma cruzi.

Já os dois derivados semissintéticos da sakuranetina não demonstraram ação antiparasitária.

Alguns dos principais resultados do estudo, realizado no âmbito do projeto “Princípios com potencial anti-Leishmania em espécies vegetais da Mata Atlântica: avaliação, isolamento e caracterização molecular”, desenvolvido em conjunto por Lago e pela pesquisadora Patricia Sartorelli, com apoio da FAPESP, foram publicados na revista Experimental Parasitology.

“A sakuranetina demonstrou ser a única substância ativa entre os demais flavonoides encontrados em Baccharis retusa DC. contra os parasitas causadores da leishmaniose e da doença de Chagas”, disse Lago.

Ação anti-inflamatória

Em outro estudo, Lago e a pesquisadora Carla Prado, da Unifesp, em colaboração com colegas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), avaliaram a atividade anti-inflamatória da sakuranetina em um modelo experimental de asma induzida em camundongos.

Um grupo de animais foi tratado durante cinco dias com sakuranetina e um grupo controle recebeu dexametasona.

Os resultados do estudo, publicado no British Journal of Pharmacology, indicaram que o tratamento com sakuranetina atenuou vários aspectos da inflamação alérgica das vias aéreas dos animais, ao reduzir citocinas e quimiocinas pró-inflamatórias e controlar o estresse oxidativo.

De acordo com os autores do estudo, os efeitos da sakuranetina foram semelhantes aos observados em animais tratados com dexametasona na maioria dos parâmetros avaliados.

“A sakuranetina é um potencial candidato para o desenvolvimento de um protótipo molecular para a obtenção de uma nova droga voltada para o tratamento de asma”, avaliou Lago.

Ação antimicrobiana

Em colaboração com Marcelo Vallim e Renata Pascon, da Unifesp, e com Antonio Doriguetto e Marisi Soares, da Universidade Federal de Alfenas, os pesquisadores também caracterizaram a estrutura cristalina da sakuranetina e avaliaram a ação antimicrobiana do composto bioativo contra leveduras dos gêneros Candida, Cryptococcus e S. cerevisiae BY 4742.

Publicado na revista Molecules, o estudo mostrou que a substância apresentou forte atividade antifúngica contra as leveduras patogênicas e pode ser considerada como um protótipo pela indústria farmacêutica para o desenvolvimento de agentes antifúngicos mais eficazes.

“Agora estamos em um ponto crucial, que é avaliar a toxicidade da sakuranetina, porque não adianta termos uma substância que apresenta ação anti-inflamatória tão potente como a droga padrão usada no tratamento de asma se não soubermos em que concentração ela pode ser administrada em animais e humanos”, afirmou Lago.

Além da sakuranetina, os pesquisadores da Unifesp estudaram outros compostos bioativos durante o projeto “Uso sustentável da biodiversidade de áreas remanescentes da Mata Atlântica do Estado de São Paulo: avaliação, isolamento e caracterização molecular de metabólitos secundários bioativos em espécies vegetais”, realizado com apoio da Fundação, no âmbito do Programa FAPESP de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA).

O artigo In vitro antileishmanial and antitrypanosomal activities of flavanones from Baccharis retusa DC. (Asteraceae) (doi: 10.1016/j.exppara.2011.11.002), de Lago e outros, pode ser lido na revista Experimental Parasitology em www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0014489411003298.

E o artigo Flavonone treatment reverses airway inflammation and remodelling in an asthma murine model (doi: 10.1111/bph.12062), de Toledo e outros, pode ser lido no British Journal of Pharmacology em onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/bph.12062/full8.

Já o artigo Structural Crystalline Characterization of Sakuranetin — An Antimicrobial Flavanone from Twigs of Baccharis retusa (Asteraceae) (doi: 10.3390/molecules19067528), de Lago e outros, pode ser lido na revista Molecules em www.mdpi.com/1420-3049/19/6/7528.

Link da reportagem: http://agencia.fapesp.br/planta_da_serra_da_mantiqueira_tem_composto_com_acao_antiinflamatoria_/20590/