Minas Gerais: entre o isolamento social e o alinhamento a Bolsonaro

Quinta-feira, 14 de maio de 2020


Por Thiago Rodrigues Silame (doutor em Ciência Política pela UFMG e professor da UNIFAL-MG) e Helga do Nascimento de Almeida (doutora em Ciência Política pela UFMG e professora da Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF)

O primeiro caso de infecção pelo novo coronavírus no estado de Minas Gerais foi confirmado em 8 de março. Cinco dias depois, o governo do estado decretou situação de emergência em saúde pública.

Para lidar com a pandemia, o estado organizou comitês em duas frentes, saúde e economia. No dia 16 de março foi instituído o Comitê Gestor do Plano de Prevenção e Contingenciamento em Saúde da Covid-19; no dia seguinte, o Comitê de Crise para a Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19 e em 25 de março, o Comitê Extraordinário Gestor de Ações de Recuperação Fiscal, Econômica e Financeira do Estado.

Outras medidas relacionadas à tentativa de proteção da economia foram decretadas: atualização do Plano de Contingenciamento de Gastos; abertura de crédito especial ao Orçamento Fiscal do Estado em favor das unidades orçamentárias e de créditos suplementares em favor do Fundo Estadual de Proteção e Defesa ao Consumidor e do Fundo Especial do Ministério Público do Estado.

Em relação às medidas de proteção social aos mineiros em vulnerabilidade foram criados o Conselho de Solidariedade para Combate à Covid-19 e aos seus Efeitos Sociais e um benefício destinado à prestação de assistência alimentar às famílias de estudantes matriculados na rede pública.

A primeira iniciativa do governo estadual para definir serviços essenciais veio completamente alinhada à Presidência da República, por meio da regulamentação da Lei nº 13.979 de 6 de fevereiro de 2020, com a publicação dos decretos federais nº 10.282 e o nº 10.288, ambos editados na segunda quinzena de março.

Em 17 de março foi confirmado pela Secretaria de Saúde mineira o primeiro caso de contaminação comunitária. No dia 20 de março, o governo de Minas Gerais reconheceu o estado de calamidade pública. A partir dessa data definiu-se o fechamento do comércio em todas as cidades do estado, aulas em instituições educacionais públicas e privadas foram suspensas e o transporte intramunicipal foi reduzido à metade.

No entanto, em reunião ocorrida em 23 de abril o governador Romeu Zema lançou o programa “Minas Consciente – Retomando a economia do jeito certo” com orientações de procedimentos para municípios que decidirem abandonar o isolamento social, demonstrando novamente seu alinhamento com as recomendações publicizadas por Bolsonaro. A adoção ou não de medidas de flexibilização do isolamento social cabe aos prefeitos dos municípios mineiros, mas fato é que muitos estão sendo pressionados por associações comerciais para que haja liberação das atividades. A possibilidade de uma reabertura massiva no estado tem causado preocupação em alguns setores da sociedade. Isso porque simulações estatísticas indicam que o pico da infecção pelo novo coronavírus em Minas Gerais ainda não chegou, e se dará no mês de junho de 2020.

O alinhamento do governador de Minas Gerais ao posicionamento do presidente da República pode ser explicado por crença e necessidade

Em Minas Gerais, pode-se dizer que o governador Romeu Zema tem adotado medidas ambíguas em relação à adoção de isolamento horizontal, o que o coloca em alinhamento político com Bolsonaro e em rota de colisão com o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD).

O embate entre o governador do estado e o prefeito da capital gira em torno da adoção de medidas mais ou menos restritivas de circulação de pessoas e do isolamento social. Importante salientar que Belo Horizonte é referência de tratamento de alta complexidade para a região metropolitana e um afrouxamento das regras de isolamento das cidades limítrofes pode sobrecarregar os serviços hospitalares da capital.  

No dia 24 de março, Bolsonaro, em pronunciamento realizado em  cadeia nacional, questionou a medida de isolamento social horizontal alegando que esta trará prejuízos à economia e minimizou a gravidade da doença. O governador demonstrou estar em sintonia com o pronunciamento do presidente quando se distanciou do movimento dos demais governadores não assinando a “Carta aberta à sociedade brasileira em defesa da democracia”, documento assinado por 20 governadores e que manifestava apoio aos presidentes das casas legislativas federais.

O alinhamento exacerba-se após o governador se reunir com o presidente, no dia 9 de abril. Zema determinou o retorno parcial das atividades da rede estadual de educação para o dia 14 daquele mês. A medida acabou derrubada por decisão judicial. Contudo, os esforços para a reabertura do estado seguem.

O alinhamento do governador de Minas Gerais ao posicionamento do presidente da República pode ser explicado por crença e necessidade. Crença, pois acredita no dilema colocado pelo presidente. Necessidade, pois Minas Gerais é um dos estados da federação que apresenta um dos piores quadros financeiros e fiscais. Antes mesmo da pandemia, Zema estudava a adesão do estado ao plano de recuperação fiscal proposto pela União. A contrapartida exigida pelo governo federal seria uma política de ajuste fiscal que requereria um programa amplo de privatizações, reforma da previdência estadual e redução do gasto com funcionalismo público.

*Artigo originalmente publicado no jornal Nexo, link: https://www.nexojornal.com.br/especial/2020/05/10/Como-os-governos-estaduais-lidam-com-a-pandemia