No dia 11 de julho, o universo acadêmico perdeu, aos 83 anos, o antropólogo e educador Carlos Rodrigues Brandão, Professor Emérito da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Brandão, como era carinhosamente conhecido, é uma referência para os campos da Antropologia Rural, Cultura e Educação Popular, tendo atuado em momentos fundamentais da Educação brasileira, influenciando milhares de pesquisadores na luta por uma educação transformadora.
Amigo e parceiro de Paulo Freire, Brandão era formado em Psicologia, com mestrado em Antropologia e doutorado em Ciências Humanas. Mesmo aposentado, o professor atuava como colaborador nos Programas de Pós-Graduação em Antropologia e no doutorado em Ciências Sociais da Unicamp, realizando estudos sobre os espaços de vida e trabalho de populações rurais tradicionais, especialmente no interior de São Paulo e Minas Gerais.
Foi professor visitante de inúmeras universidades, pesquisador do Instituto Paulo Freire e recebeu vários prêmios, sempre compreendendo as homenagens como algo plural, de reconhecimento a um coletivo. No ano de 1998, o professor foi contemplado com o título de Comendador do Mérito Científico pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e de Professor Benemérito do Centro de Memória da Unicamp (CMU). Em 2006, foi agraciado com a medalha Roquette Pinto da Associação Brasileira de Antropologia. Em 2008 e 2010, recebeu os títulos de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal de Uberlândia e pela Universidade Federal de Goiás. Em 2015, foi a vez de receber o título de Professor Emérito pela Unicamp.
Na UNIFAL-MG marcou presença em diversos eventos, presencialmente ou virtualmente, tal como nas Jornadas Universitárias em Defesa da Reforma Agrária de 2021, em que foi conferencista principal. Ainda em 2021, durante a pandemia, ministrou em conjunto com a professora Carmem Lúcia Rodrigues (Calu) uma disciplina para estudantes de graduação da UNIFAL-MG: “Olhares Cruzados e Antropologia Reversa”. Foi seu último curso realizado oficialmente em uma universidade.
O professor Sandro Amadeu Cerveira, reitor da UNIFAL-MG, comenta a contribuição expressiva do educador para a área de Educação Popular. “O professor Brandão contribuiu de forma significativa para a Educação brasileira, publicando mais de 100 obras nos 50 anos dedicados à carreira de professor, um legado que sempre valorizou os saberes dos povos originários e comunidades ribeirinhas”, disse.
Carmem Lúcia Rodrigues (Calu), professora e pesquisadora do Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL) da UNIFAL-MG, foi orientada pelo professor Brandão durante seu doutorado em Antropologia Social, realizado na Unicamp, oportunidade em que estabeleceu uma relação de amizade com o educador.
Emocionada, a professora compartilhou um relato sobre a vida do educador e amigo:
“Muito foi dito, escrito e divulgado pelas redes sociais sobre a grandiosa obra de Carlos Rodrigues Brandão desde sua partida, há exatos sete dias (11/07/2023). Era um escritor compulsivo, publicou mais de setenta livros, que tratam de temas aos quais se dedicou por décadas: educação (sobretudo a educação popular), comunidades tradicionais, cultura popular. Escreveu e publicou, ainda, livros de poesia, livros infantis, livro de fotografia e de plantas, letras de música.
Foi professor por mais de cinquenta anos, em diversas universidades brasileiras e no exterior. Etnógrafo primoroso, pesquisou em campo a cultura popular ao longo de toda sua vida, nos rincões mais isolados dos sertões mineiros até em aldeias remotas da Galicia (Espanha), onde morou. No trabalho de campo exercitava, como maestria inigualável: a escuta atenta, o olhar perspicaz, a troca de saberes e sobretudo a com-vivência amorosa com o povo do campo: mestres de folias de reis e do congado, agricultores e agricultoras, quilombolas, indígenas e outras tantas gentes…
Conheci o Brandão em 1997, no ano em que se aposentou da Unicamp. Foi ele o responsável por minha conversão à antropologia. Coerente aos preceitos da educação em que apresenta no famoso livrinho de bolso da Coleção Primeiros Passos “O que é a Educação” (1981), Brandão nos ensinava a “ler o mundo” (e, no meu caso, a antropologia) a partir de seu próprio exemplo, na lida com as pessoas. Revelava de maneira informal, nas histórias que gostava de contar, conhecimentos eruditos de obras clássicas, de preferência ao longo das caminhadas pelas estradinhas de terra no Sul de Minas. Como sua orientanda de doutorado na Unicamp, o Brandão me conduziu com leveza e grande sensibilidade na realização de uma pesquisa etnográfica sobre o “Fandango Caiçara” entre os anos de 2009 a 2013.
Uma das coisas que o Brandão mais gostava de fazer era caminhar ao lado de pessoas amigas ao redor do sítio dele em Caldas (MG) para apreciar as matas, as cachoeiras, as montanhas e, em especial, os passarinhos. Foi o carioca mais mineiro que já conheci! Muito ainda será dito e lembrado desse grande educador e antropólogo, mas para nós, que tivemos a alegria de estar por um longo tempo ao seu lado, no sítio “Rosa dos Ventos”, o que fica é a certeza de que ele foi uma das pessoas mais generosas desse mundo. Sua maior alegria era a partilha da vida (título de um livro dele, lindo!). Generoso, afetuoso e agregador, é assim que sempre nos lembraremos dele, o nosso querido Brandão.”
Em nome da UNIFAL-MG, a Reitoria presta solidariedade aos familiares, amigas e amigos, rendendo homenagem ao professor e educador popular!