Pesquisa apresenta diagnóstico da realidade socioeconômica dos agricultores familiares de Alfenas

Investigação realizada no mestrado em Gestão Pública e Sociedade revela desafios enfrentados pela categoria, bem como a importância de políticas públicas para o orçamento familiar do grupo

A realidade socioeconômica dos agricultores familiares do município de Alfenas, bem como o impacto de políticas públicas para o fomento da categoria, foi objeto de investigação de uma pesquisa de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública e Sociedade (PPGPS) da UNIFAL-MG. O trabalho foi realizado pela acadêmica Maria Luísa Monteiro Martins, sob a orientação dos professores, Everton Rodrigues da Silva (Tom) e Fernando Batista Pereira, pesquisadores do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA).

Everton Rodrigues da Silva (Tom) e Fernando Batista Pereira, pesquisadores do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA) – orientadores do estudo. (Fotos: Reprodução/Arquivo)

Motivada pelo debate em torno da temática Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (SSAN) e na presença representativa dos agricultores na Feira Livre de Alfenas, a pesquisadora realizou um diagnóstico que teve como foco a agricultura familiar do município.

Segundo ela, esse foco se justificou pela relevância da categoria na concretização das políticas e estratégias sustentáveis voltadas para a produção, distribuição e consumo de alimentos. “No município de Alfenas, um elo bastante reconhecido entre essa categoria e a sociedade é a Feira Livre, patrimônio histórico da cidade, que não foi objeto de análise da pesquisa, mas, inicialmente, foi a responsável por chamar a atenção para um estudo que abordasse a categoria social”, explica.

A investigação intitulada “Sistemas agroalimentares locais: diagnóstico da agricultura familiar alfenense” mostrou que embora os agricultores familiares do município tenham consciência do papel importante que desempenham para a sociedade, eles também enfrentam desafios que impactam o trabalho e a qualidade de vida. Um dos desafios diz respeito à tecnologia. De acordo com a pesquisa, apesar de 68% dos entrevistados concordarem que a tecnologia promoveu melhorias para a produção, também é fator de impasse, uma vez que muitos agricultores esbarram nas dificuldades de acesso a determinados equipamentos.

“No município de Alfenas, um elo bastante reconhecido entre essa categoria e a sociedade é a Feira Livre, patrimônio histórico da cidade, que não foi objeto de análise da pesquisa, mas, inicialmente, foi a responsável por chamar a atenção para um estudo que abordasse a categoria social”, explica Maria Luísa Monteiro Martins. (Foto: Arquivo Pessoal)

“A tecnologia foi citada como principal fator de mudança no processo produtivo, o que, para a maioria, tem facilitado os processos”, diz. “Mas, ao mesmo tempo, ficou identificado que a maioria dos agricultores não possui tais equipamentos, necessitando ‘alugá-los’. Exemplo disso é a necessidade de apoio da prefeitura do município para a disponibilização, ao menos, de um trator”, conta a pesquisadora.

Maria Luísa Martins menciona que o estudo também indicou que os agricultores familiares têm mudado o cenário de tendência de envelhecimento da população rural, encontrado pela Organização das Nações Unidas (FAO) na América Latina e Caribe. “Em Alfenas, há indícios de uma renovação da agricultura familiar, pois há crescimento de gestores de estabelecimentos rurais com idade entre 25 e 35 anos e 36% dos respondentes da pesquisa apontaram que seus filhos têm interesse em continuar a atividade rural”, aponta.

Conforme a pesquisadora, esse percentual pode sofrer alterações, tendo em vista que alguns entrevistados informaram que seus filhos não possuem idade para o trabalho e nem para escolher se querem ou não continuar na atividade rural. “Fatores como a disponibilização de escola rural, transporte escolar, tecnologia – de fato acessível -, campanhas de valorização da agricultura familiar, maiores percentuais de aquisição de alimentos pelo PNAE [Programa Nacional de Alimentação Escola], podem ser determinantes para essa decisão”, argumenta.

O PNAE, como política pública que visa oferecer alimentação escolar e ações de educação alimentar e nutricional a estudantes de todas as etapas da educação básica pública, foi identificado no estudo como um programa estratégico para a manutenção da agricultura familiar de Alfenas. A pesquisa evidencia que são esses agricultores os responsáveis por fornecer mais de 30 tipos de gêneros alimentícios de hortifruti para a merenda escolar de alunos de escolas municipais e dos centros municipais de educação infantil (CEMEIs), que têm em sua dieta alimentos diversos e frescos.

“Ficou constatado que sem o PNAE 28% das famílias não conseguiriam manter seus rendimentos e 56% mencionaram que teriam o orçamento familiar descontrolado”, detalha Maria Luísa Martins.

Um dos pontos positivos destacados pelos agricultores familiares diz respeito à existência e qualidade da escola rural localizada na Comunidade dos Bárbaras. No trabalho, a autora destaca: “Vários respondentes, até mesmo aqueles que não possuem filhos ou que possuem, mas fora da idade escolar, elogiaram a escola rural e deram a sua opinião sobre os referidos assuntos. A maioria informa que há escola na comunidade e que não há dificuldades de deslocamento até ela. Isso foi justificado pela existência de transporte escolar que apanha as crianças em casa e as leva até a escola.”

Como a pesquisa foi feita
Registro feito durante a entrevista com representantes da Comunidade dos Bárbaras. (Foto: Arquivo Pessoal)

O desenvolvimento do estudo contou com pesquisa bibliográfica sobre o tema e pesquisa de campo, oportunidade em que a acadêmica identificou e entrevistou agricultores familiares alfenenses fornecedores de alimentos ao PNAE. “Foi buscada a Chamada Pública da Prefeitura de Alfenas, que credencia os fornecedores da merenda escolar, como é popularmente chamado o PNAE. Logo, ficou descoberto que três associações são as fornecedoras: a Associação de Mulheres Agricultoras Artesãs da Comunidade Rural dos Bárbaras (AMAACORB), a Associação de Agricultores Familiares de Alfenas e Região (AAFAR) e a Associação dos Feirantes das Feiras Livres de Alfenas (AFFLA)”, explica Maria Luísa Martins.

A pesquisa foi desenvolvida durante o período do mestrado, entre 2021 e 2023, com parte dedicada ao referencial teórico e outra parte à aplicação e análise de dados. O público participante das entrevistas foi formado por 54 pessoas, cujas respostas receberam análise por meio de estatística descritiva, utilizando gráficos e tabelas.

Desdobramentos

Conforme a pesquisadora, dois artigos ligados à pesquisa já foram submetidos a periódicos. Um dos artigos trata da temática da Soberania e Segurança alimentar e Nutricional (SSAN) com o título “Mais uma vez, o Brasil se faz colônia: a dependência brasileira de fertilizantes no contexto da guerra entre Rússia e Ucrânia”. O outro se relaciona com os resultados da dissertação e trabalha o tema “Programa Nacional de Alimentação Escolar: limites e possibilidades no município de Alfenas-MG”.

Formada em Direito, atualmente Maria Luísa Martins é professora substituta do Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL) da UNIFAL-MG.

Para conhecer detalhes sobre a pesquisa de mestrado da acadêmica, acesse na íntegra a dissertação no repositório da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UNIFAL-MG, neste link.