UNIFAL-MG (1914 – 2024): 110 anos de uma trajetória gloriosa

Alisson Eugênio¹

Há 110 anos (1914) nascia a Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas (Efoa), resultado da iniciativa de um grupo liderado pelo seu idealizador e primeiro diretor (1914-1933), João Leão de Faria (1883-1965). Estava-se no auge da Belle Epoque: uma época de relativa tranquilidade na geopolítica ocidental, de grande prosperidade proporcionada pela industrialização e de grande crença na ciência como instrumento de intervenção na vida cotidiana e na sua capacidade de melhorar a condição humana.

Essa crença estava fundamentada na ideia de progresso que, vista então como uma lei histórica do desenvolvimento da civilização, impactou a mentalidade de pessoas, como o grupo liderado por Leão de Faria, em um contexto histórico favorável, para iniciativas vanguardistas. No Brasil também ocorria notável desenvolvimento econômico gerado pela ampliação das exportações de produtos primários, em especial o café e a borracha, e pelo surto industrial que, em conjunto, estimulou o ideário progressista que está na base do sonho da criação da Efoa.

Essa escola, depois de muita resistência contra as crises que quase a fizeram desaparecer, consolidou-se, foi federalizada em 18/12/1960 pela Lei 3854, foi elevada à condição de Centro Universitário pela Portaria 2101, de 15/10/2001 e, finalmente, foi transformada na Universidade Federal de Alfenas pela Lei 11154 de 29/07/2005.

Tal instituição universitária, reconhecendo-se como resultado histórico da evolução da Efoa, celebra, neste memorável três de abril de 2024, 110 anos de uma gloriosa trajetória, marcada pela dedicação de seu pessoal para promover o desenvolvimento humano, tão necessário ao avanço da humanidade, por meio do ensino, da pesquisa e da extensão do conhecimento.

Durante esse longo percurso, além da criação da Efoa acima contextualizado, de todos os demais acontecimentos marcantes, apenas dois serão destacados devido a limitações de laudas deste artigo. O primeiro deles é a incorporação dessa escola ao sistema público federal de ensino, pelas razões que sua então diretoria apresenta no trecho do documento abaixo reproduzido

“A federalização da Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas é uma medida patriótica e inadiável que se impõe para a elevação do nível do ensino superior, levando em conta os benefícios que este instituto de ensino tem proporcionado à população do Brasil e particularmente de Minas Gerais. A Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas é a única no gênero, em toda a região Sul Mineira, com meio século de existência, de iniciativa particular, assistida por minguados recursos oficiais, fadada a desaparecer se não for amparada, com urgência, pelo Governo.” [1]

Percebe-se que se trata de um pedido de socorro, acolhido pelo governo federal. Na época, o mineiro Juscelino Kubistchek de Oliveira (JK) era o presidente da República. Além de mineiro, ele foi médico e conhecia a importância da Efoa na formação de profissionais tão necessários para melhorar o quadro da saúde pública nacional. Estava-se no auge da era do desenvolvimentismo. E o então presidente havia sido eleito com o seu famoso slogan de campanha: “Precisamos desenvolver o país 50 anos em 5.” Para isso, educação e saúde foram considerados dois pilares fundamentais. O Brasil precisava ampliar seus investimentos em educação, melhorar a qualidade e aumentar a oferta das escolas em todos os seus níveis de ensino. Precisava também melhorar as condições sanitárias da sua população, a começar com a maior oferta de profissionais da saúde.

Dessa maneira, a conjuntura conspirava a favor da Efoa, pois, além de tudo isso, havia no país ampla discussão nos meios intelectuais e em certos círculos políticos progressistas sobre a necessidade de se superar o subdesenvolvimento, o que favorecia e reforçava o pedido de socorro da escola. Afinal, um governo desenvolvimentista, liderado por um médico que havia visitado tal escola em 1953, na condição de governador de Minas Gerais, quando recebeu dela o título de honoris causa, dificilmente deixaria de socorrer uma instituição que já havia prestado e ainda poderia prestar, como o tempo revelou, grandes serviços à sociedade.

Sendo assim, a Efoa, como instituição de ensino especializada em dois importantes campos de conhecimento na área de saúde, ao integrar a rede federal de ensino superior, tornou-se instrumento da política pública desenvolvimentista, razão pela qual, a sua federalização foi, portanto, um marco histórico extremamente relevante na gloriosa trajetória da UNIFAL-MG, porque não somente salvou a escola que lhe originou, mas também inaugurou o processo de sua expansão e modernização.

O segundo acontecimento de grande relevância histórica na gloriosa trajetória da UNIFAL-MG é a conversão da Efoa/Ceufe de centro universitário à condição de universidade. A então direção de tal instituição, comandada pelo prof. Maciro Manoel Pereira, movimentou-se politicamente, ao longo de 2004, enviando uma petição ao Ministério da Educação para promover a referida conversão. [2]

Quando essa petição foi enviada para Brasília, a direção do centro universitário de Alfenas empenhou-se para buscar apoio político necessário à criação da UNIFAL-MG, recorrendo inicialmente ao deputado federal Geraldo Thadeu Pereira dos Santos (PPS-MG), que, como ex-aluno da antiga Efoa, abraçou a causa dessa criação ao articular forças dentro e fora do Congresso, liderando uma campanha para que tal causa obtivesse êxito. Para tanto, reuniu parte considerável de políticos mineiros que ocupavam cargos de grande influência política, como o vice-presidente da República, José de Alencar Gomes, o seu assessor parlamentar, Flúvio Cássio Mello e Souza, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, o senador do mesmo Estado, Eduardo Azeredo, o secretário de Ciência e Tecnologia, Olavo Bilac Pinto Neto e diversos deputados federais (Odair da Cunha, Ildeu Araújo, Isaías Silvestre, Márcio Reinaldo Dias Moreira, Roberto Brant, entre outros).

Essa sinergia política foi favorecida pela situação histórica criada com a eleição do presidente Lula e o compromisso de seu governo de expandir o ensino superior no país como uma das molas propulsoras das políticas públicas destinadas à melhoria da qualidade e ampliação da oferta de pessoal de nível universitário, que em 2007 culminou na implantação do plano de expansão universitária conhecido como REUNI.

Desse último marco histórico para cá, nesse solene dia 3 de abril de 2024, a UNIFAL-MG, ao comemorar 110 de anos de existência de dedicação à missão de contribuir para um Brasil melhor, por meio do ensino, da pesquisa e da extensão, vem se consolidando como uma das mais importantes universidades do país e, com a sinergia de seus agentes e o apoio de governos esclarecidos, responsáveis e cientes do papel que a universidade desempenha no progresso nacional, certamente ela continuará trilhando seu caminho rumo ao futuro ainda melhor.

[1] Sinopse da Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas. Alfenas, Efoa, 1960, p. 1.

[2] Ofício Ceufe/Efoa, gabinete da diretoria, n. 004/2004, 16/01/2004.


Alisson Eugênio é professor de História do Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL) da UNIFAL-MG. Graduado em História pela Universidade Federal de Ouro Preto, mestre em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, doutor em História Econômica pela Universidade de São Paulo e pós-doutor pela UFMG, o docente organizou a obra “História de uma instituição centenária e de sua primeira década de transformação em universidade – 2005-2015”, que integrou as homenagens ao Centenário da Instituição e aos seus 10 anos de transformação em Universidade. O pesquisador é também autor dos livros: “Fragmentos de liberdades: as festas religiosas das irmandades de escravos em Minas Gerais na época da Colônia”, “Reforming habits: the struggle against poor healt conditions in 19th Brazil”, “Arautos do progresso: o ideário médico sobre saúde pública no Brasil na época do Império”, “Fontes para o estudo da história de Alfenas”, “Lágrimas de sangue: a saúde dos escravos no Brasil da época de Palmares à Abolição” e “Verso e reverso da modernidade: a modernização em Alfenas na Primeira República”, “As muitas faces de um gênio: tempo, vida e obra de Leonardo da Vinci” e “Horizontes da nação: desafios brasileiros após 200 anos de Independência”.