Estudo da UNIFAL-MG revela impactos dos incêndios florestais na diversidade funcional das aves da Mata Atlântica

Trabalho de iniciação científica identificou redução no número de espécies de aves nas áreas queimadas em comparação com as florestas intactas

A Mata Atlântica é um dos biomas mais ricos e ameaçados do mundo, desempenhando um papel vital para a saúde do planeta e de suas populações. Estendendo-se por 17 estados brasileiros, do Piauí ao Rio Grande do Sul, além de partes do Paraguai e da Argentina, essa floresta tropical abrange 15% do território brasileiro. Apesar da importância da preservação desse ecossistema para a manutenção de inúmeras espécies, a Mata Atlântica enfrenta degradação e perda significativa de áreas que afetam diretamente a biodiversidade. Um estudo recente da UNIFAL-MG revelou os impactos negativos dos incêndios florestais na diversidade e nas funções desempenhadas pelas aves nesse bioma. Aproveitando a data em que se comemora o Dia Nacional da Mata Atlântica, no próximo dia 27 de maio, vale a pena conhecer esse trabalho, cujos resultados reforçam a importância de proteger esse bioma.

(Foto: Reprodução/Fundação SOS Mata Atlântica)

“Descobrimos que quanto maior a frequência de fogo na floresta, menor será a diversidade funcional de aves”, diz a acadêmica Bianca Dinis da Silva, autora do projeto de iniciação científica do curso de Ciências Biológicas (Bacharelado), que apresentou resultados inéditos. “É ruim porque a perda de funções afeta não só o ecossistema, mas também os serviços que as aves prestam aos seres humanos como polinização, dispersão de sementes e controle de pragas”, argumenta. “Até o momento em que o estudo foi desenvolvido não haviam artigos que avaliassem os efeitos dos incêndios florestais sobre a diversidade funcional de aves na Mata Atlântica”, acrescenta.

Os resultados indicam uma redução da diversidade em áreas queimadas, o que comprova que quando uma floresta é queimada, o número de espécies de aves diminui. “Há menos tipos diferentes de aves vivendo nessas florestas queimadas em comparação com as florestas intactas. Algumas espécies de aves conseguem lidar melhor com o fogo do que outras. Isso depende da quantidade de floresta que ainda resta após o incêndio e das características específicas de cada grupo de aves”, explica.

Bianca Dinis da Silva – autora da pesquisa, bióloga e mestranda da UNIFAL-MG. (Foto: Arquivo Pessoal)

Outra constatação interessante foi que paisagens com maior quantidade de floresta conseguem manter uma diversidade funcional de aves mais estável, mesmo quando ocorrem incêndios. “Isso significa que o desmatamento e o fogo atuam de maneira sinergética, amplificando os efeitos negativos sobre a diversidade funcional de aves Mata Atlântica”, enfatiza.

De acordo com a autora do projeto, o estudo potencializa a importância da conservação ao apontar que a Mata Atlântica é um bioma muito sensível ao fogo e está em perigo. “Nossos resultados reforçam a necessidade de medidas preventivas de incêndios florestais nos fragmentos florestais, como forma de preservação da biodiversidade e serviços ecossistêmicos”, afirma.

“Com a tecnologia de monitoramento de queimadas, existente atualmente, é possível determinar áreas em que ocorrem incêndios com maior frequência para medidas preventivas, como aumento da fiscalização ou atividades de educação ambiental com a população local, para evitar incêndios intencionais”, aponta.

Colaboração de pesquisadores do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação da UNESP

Orientada pela professora Érica Hasui, do Instituto de Ciências da Natureza, a pesquisa contou com a colaboração do professor Milton Ribeiro, do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação (LEEC) da UNESP, pesquisador responsável pelo Projeto de Longa Duração da Cantareira-Mantiqueira (PELD). “A pesquisa foi realizada durante a pandemia. Assim, não pudemos ir a campo. A alternativa que encontramos para viabilizar o projeto foi trabalhar em colaboração com o Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação”, conta Bianca Silva.

Acadêmica Bianca Silva junto aos colegas biólogos, também pesquisadores. (Fotos: Arquivo/Bianca Silva)

Conforme ela, o laboratório abriga acadêmicos e pesquisadores que coletam e identificam as espécies em gravações acústicas das aves na região. O grupo compartilhou áudios que inclui parte dos dois maiores fragmentos de vegetação nativa contínua de Mata Atlântica. Esses fragmentos correspondem às Serras da Cantareira e da Mantiqueira, assim como ao Corredor Ecológico Cantareira-Mantiqueira, entre São Paulo e Minas Gerais.

As gravações possibilitaram que a acadêmica, junto ao grupo de pesquisa, calculasse a diversidade funcional das aves em 22 paisagens contendo variações na quantidade de floresta e nas características dos incêndios. “Os dados dos incêndios foram obtidos no site do INPE [Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais]. Com esse conjunto de informações, conseguimos gerar modelos estatísticos para avaliar a influência do fogo e da paisagem sobre a diversidade funcional de aves”, detalha. Foram levantados dados dos atributos morfológicos, de forrageamento e de preferências de habitat de 143 espécies.

Bianca Silva concluiu o projeto de iniciação científica em 2022 e continua pesquisando sobre o tema no mestrado que está desenvolvendo junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais (PPGCA) da UNIFAL-MG. “Além de sempre ter tido interesse pela área de pesquisa, o cenário atual do meio ambiente no Brasil é o que me motiva a dar continuidade nessa linha, pois nos últimos anos presenciamos um aumento nos números de incêndios florestais em locais que não ocorrem de maneira natural”, compartilha.

“A Mata Atlântica é uma floresta intensamente devastada, que ainda assim possui muitas espécies endêmicas [exclusivas da região e que não são encontradas em nenhum outro lugar do mundo] e que precisam de esforços para conservação. Entender como o bioma está sendo afetado e delinear os fatores que podem influenciar na ocorrência e propagação dos incêndios, bem como áreas que podem atuar como refúgios ecológicos nos momentos em que ocorrem os incêndios é o que mais me instiga nessa nova fase da pesquisa”, conclui a mestranda.

Atualmente, a pesquisa ganhou amplitude na coleta de dados e no desenvolvimento de pesquisa de iniciação científica, de mestrado e de doutorado, com a participação de discentes da UNIFAL-MG – Wellington Corrêa, Alyson José Gonçalves dos Santos e Ederson José de Godoy -, e da UFSCar – Bruno Faria da Cunha Barbosa Adorno.