Renda do trabalho no Brasil na crise da Covid-19

Ana Márcia Rodrigues da Silva
Otávio Junio Faria Neves
Thomas Henrique Caetano de Assis

O mercado de trabalho foi fortemente afetado pela crise econômica no contexto da pandemia da Covid-19. Os trabalhadores mais atingidos são os que já estavam em situação de vulnerabilidade ocupacional (DIEESE, 2020). Entre eles destacam-se as mulheres, os pretos e as pessoas com menores níveis de escolaridade.

São diversos os efeitos negativos que se refletiram na classe trabalhadora. O desemprego acentuado, o teletrabalho, a terceirização, o trabalho em tempo parcial e a subcontratação são exemplos desses problemas (COSTA, 2020). Além disso, os trabalhadores desprotegidos e as famílias em estado de vulnerabilidade sofreram com a redução nas fontes de renda (OIT, 2020). Por estes motivos é necessário salientar alguns efeitos dessa crise sanitária em termos da renda do trabalho.

Os microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD – Covid-19) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam que a renda média nominal do trabalho aumentou minimamente entre julho e agosto de 2020. Todavia, entre os meses de agosto e novembro do mesmo ano, a renda média do trabalho foi reduzida mês a mês, passando de R$ 2378,90, em setembro, para R$ 2334,86, em novembro.

Apesar disso, houve também uma redução na dispersão das rendas nestes meses, justificada pela saída de trabalhadores do mercado de trabalho no cenário da pandemia. Os trabalhadores que tiveram seus empregos mantidos no período de crise enfrentaram menos prejuízos em termos do seu bem-estar, sendo importante retratar uma análise mais acurada da desigualdade de renda do trabalho verificada neste período, como pode ser visto no gráfico abaixo.

Desigualdade de renda do trabalho entre julho e novembro de 2020

Nota-se que houve uma pequena redução da desigualdade, uma vez que o índice de Gini[1] passou de 0,46799, em julho de 2020, para 0,4606, em novembro, uma redução de 1,58%. Entretanto, este fator não se configura em um aspecto positivo, já que a justificativa para essa diminuição se deve à saída de trabalhadores do mercado de trabalho, denotando perdas de renda do trabalho e fontes de sustento das famílias.

Quando se observa a contribuição relativa dos grupos de trabalhadores para a desigualdade de renda do trabalho – por meio da decomposição do índice de Gini, no mesmo período – verifica-se que os homens contribuíram mais que as mulheres para essa desigualdade, com contribuição de 58,75%, em setembro de 2020. Além disso, as pessoas que se autodenominam brancas, em relação às outras raças, contribuíram em 46,62% para a desigualdade da renda do trabalho. Isso demonstra que os trabalhadores do sexo masculino e brancos justificaram grande parte da desigualdade encontrada, nos respectivos grupos.

Quanto à escolaridade, os indivíduos que possuíam ensino médio completo foram os que mais contribuíram para a desigualdade, com participação de 34,42%, em novembro de 2020. A maior participação destes trabalhadores se justifica em razão do número de trabalhadores que possuíam este nível de escolaridade. Outro grupo de trabalhadores que se destacou foi o grupo com ensino superior completo, cuja participação foi de 19,04%, em agosto de 2020. Esta participação pode ser atribuída, principalmente, à dispersão das rendas obtidas por estes indivíduos.

Mediante o cenário de crise econômica, a redução da desigualdade de renda do trabalho evidenciada nos meses apresentados do ano de 2020, não representa uma melhora nos indicadores. Isso porque, esta redução pode ser atribuída às perdas de rendas do trabalho diante do cenário de desemprego e desaquecimento do mercado de trabalho. A contribuição relativa para concentração de renda, dos trabalhadores do sexo masculino, brancos, com ensino médio e com ensino superior aponta que as rendas do trabalho – no período de auge da pandemia em 2020 – estiveram concentradas nestes grupos.

 

Referências

COSTA, Simone da Silva. Pandemia e desemprego no Brasil. Revista de Administração Pública, v. 54, n. 4, p. 969-978, 2020.

DIEESE. DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS. Pandemia afeta principalmente trabalhadores mais precarizados. Boletim Emprego em Pauta. São Paulo: DIEESE, n.16.  2020.

OIT. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO TRABALHO. COVID-19 e o mundo do trabalho. 2021. Disponível em: <https://www.ilo.org/global/topics/coronavirus/lang–en/index.ht>. Acesso em: 2 de fevereiro de 2021.

PNAD-COVID-19. PESQUISA NACIONAL POR AMOSTRA DE DOMICÍLIOS – COVID-19. Microdados. Disponível em: < https://www.ibge.gov.br/estatisticas/downloads-estatisticas.html?caminho=Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_PNAD_COVID19/Microdados/Dados >. Acesso em: 10 de maio de 2021.


[1] O Índice de Gini foi criado por Conrado Gini e é um instrumento para mensurar o grau de concentração. O índice varia numericamente entre 0 e 1. Quanto mais próximo de 1, maior a desigualdade.