Indicadores da pandemia sinalizam o que esperar do cenário epidemiológico da covid-19 para 2022; pesquisador analisa parâmetros de saúde nas cidades onde há campus da UNIFAL-MG

Diante da explosão de casos de covid-19 causados pela variante Ômicron e após 56 semanas acompanhando os parâmetros de saúde e evolução da doença no estado de Minas Gerais e na região, o grupo de pesquisa liderado pelo epidemiologista e professor Sinézio Inácio da Silva Júnior, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da UNIFAL-MG, anunciou com propriedade na edição desta semana: “O Brasil vive a maior escalada de casos de covid-19 de toda a pandemia.”

A angústia de se deparar com mais um período de aumento de casos traz muitos questionamentos, sobretudo, por ameaçar a normalidade de atividades, como das próprias instituições de ensino superior, que já se preparavam para o retorno de parte das atividades presenciais e começam a adiar ou readaptar o retorno, devido aos riscos da transmissão comunitária.

Será que o cenário epidemiológico da covid-19 em 2022 será melhor que nos últimos dois anos? Qual é a situação nas cidades de Alfenas, Poços de Caldas e Varginha, nas quais a UNIFAL-MG tem campi?

“Sem dúvida nenhuma, apesar desse grande número de casos, pelo menos no curto e médio prazo, o cenário vai ser melhor”, afirma o epidemiologista e professor Sinézio Silva. (Foto: Arquivo Pessoal)

Na opinião do professor Sinézio Silva, o cenário de 2022 apresenta algumas características diferentes do que foi vivenciado nos últimos dois anos. Segundo ele, embora haja predominância da variante Ômicron, que é altamente transmissível, já existem experimentos de laboratório que apontam sintomas menos graves da infecção. Mesmo que os pesquisadores necessitem aprofundar os conhecimentos, a cobertura vacinal tem sido importante para as observações clínicas.

“Nos últimos dois anos, nós não tínhamos no primeiro ano a vacina e não tínhamos tido tempo de acumular uma população vacinada no nível que nós estamos. É preciso comparar o efeito da Ômicron entre diferentes idades e nessas idades, a pessoa vacinada e a não vacinada”, diz, afirmando que há indicativos de que a Ômicron cause manifestações patológicas menos graves.

O pesquisador observa que é preciso ponderar, no entanto, o fato de que a variante Ômicron é mais transmissível e resistente à defesa criada pela vacina e por quem já pegou a infecção de outras variantes. “A variante Ômicron tem o tal do escape imunológico, ou seja, em relação às defesas criadas por pessoas vacinadas e que já teve a doença por outras variantes, ela resiste melhor, por isso, as vacinas não estão sendo tão efetivas em conter novos casos, mas as vacinas estão sendo muito importantes para evitar mortes e um volume de internações que aconteceu nesses últimos dois anos”, constata.

Para o epidemiologista, ainda que a variável possa produzir casos menos graves e as pessoas infectadas terem que se afastar do trabalho, o que compromete a rotina de atividades, o contexto indica que não teremos que conviver com alto número de internações e óbitos. “Sem dúvida nenhuma, apesar desse grande número de casos, pelo menos no curto e médio prazo, o cenário vai ser melhor”, afirma.

Após ao que chama de “curto e médio prazo”, o pesquisador acredita que é possível vislumbrar dois cenários: um otimista e outro pessimista. Na interpretação otimista, pela lógica evolutiva, a longo prazo a pandemia seria controlada. “Seria uma variante que, somada a outras contaminações e infecções por outras variantes, mais a população vacinada, mais as infecções que ela está criando, ajudaria casos já acontecidos e acontecendo de pessoas vacinadas a produzir uma imunidade coletiva”, calcula.

O pesquisador acredita que é possível vislumbrar dois cenários: um otimista e outro pessimista. Na interpretação otimista, pela lógica evolutiva, a longo prazo a pandemia seria controlada. Já a visão pessimista seria o surgimento de outras variantes com ritmo acelerado de casos.

Já a visão pessimista seria o surgimento de outras variantes com ritmo acelerado de casos. “Se o mundo deixar acontecer um grande número de casos, isso aumenta a probabilidade de outras variantes surgirem, com grande ritmo de contágio e trazer mais preocupação”, explica, afirmando ser particularmente propenso a acreditar na visão mais otimista, porém alertando que é preciso ter prudência.

“Se pegarmos o Reino Unido e a Espanha como exemplo, eles chegaram a dois meses de aceleração de pandemia, desde que a curva começou a subir, chegaram em uma média móvel de novos casos, três vezes maior do que a maior média móvel de casos registrada ao longo do histórico da pandemia. Então, pelo menos dois meses é de se esperar que esses casos vão continuar altos e que para voltarem aos níveis que tínhamos, nós podemos demorar mais um ou dois meses”, avalia.

 
O que apontam os indicadores em relação à Alfenas, Poços de Caldas e Varginha

Conforme o epidemiologista, os indicadores básicos para serem analisados em uma situação epidemiológica é o número de mortes e o número de casos, dos quais se derivam as taxas de mortalidade, de mortalidade entre os doentes — também chamada de letalidade —, e a de incidência, que é o número de casos em relação à população.

Pelo fato de a covid-19 ser uma doença infecciosa e de curta duração, o grupo de pesquisa coordenado pelo professor e responsável pela divulgação semanal dos boletins epidemiológicos utiliza “incidência acumulada” em vez de taxa de incidência.

Entre os 10 municípios mais populosos do Sul de Minas, Alfenas ocupa o 2º lugar em incidência acumulada: a cada 100 habitantes, cerca de 15 casos são registrados. (Foto: Reprodução/Internet)

“Entre os 10 municípios mais populosos do Sul de Minas, entre os quais se encontram Alfenas, Poços e Varginha, em termos de porcentagem de casos na população, Alfenas tem 14,9%, ou seja, a cada 100 habitantes na população de Alfenas, temos quase 15 casos registrados. Isso faz com que Alfenas esteja em 2º lugar na região”, explica. Varginha tem 14,1% e Poços de Caldas tem 9% de casos registrados em relação à população.

Atualmente, o primeiro lugar é ocupado por Pouso Alegre, seguido por Alfenas, Varginha, Três Pontas, Itajubá, Passos, São Sebastião do Paraíso, Lavras e Poços de Caldas.

O epidemiologista mostra que se o Sul de Minas tem hoje 11,7% de incidência acumulada, o que significa que a cada 100 habitantes na região, 12 casos de covid-19 são identificados, a incidência acumulada de Alfenas e de Varginha é maior do que a do Sul de Minas e a incidência de Poços é menor.

“Esse indicador mostra a força da circulação do vírus ou o ritmo do contágio na população. Então nós podemos dizer que das três cidades em que nós temos campus da UNIFAL-MG, Poços de Caldas é aquela que tem o menor ritmo de contágio, abaixo inclusive do Sul de Minas. Alfenas e Varginha estão muito semelhantes. Isso é importante porque na hora de se optar, por exemplo, por voltar a atividades presenciais de universidades, é preciso levar isso em conta”, analisa.

Para exemplificar, o professor explica que, se Alfenas tem em torno de 80 mil habitantes, Poços de Caldas, 167 mil, e Varginha, 140 mil, é possível especular o impacto da volta às aulas nessas cidades. De acordo com ele, do ponto de vista epidemiológico, o impacto pode ser maior em Alfenas considerando o número de habitantes e o ritmo de contágio.

“O impacto que a UNIFAL-MG tem em aumentar o potencial de contágio e de aumentar a incidência no município de Alfenas, pela volta dessa população de estudantes e, especialmente, porque Alfenas tem um ritmo de contágio que está maior do que o do Sul de Minas, é mais prejudicial e de maior risco do que a volta dos nossos universitários para Varginha e especialmente Poços de Caldas”, constata, apontando que em comparação com 154 municípios do Sul de Minas, Alfenas tem a 17ª maior incidência acumulada; Varginha tem a 24ª maior e Poços de Caldas, a 109ª incidência acumulada.

“O impacto que a UNIFAL-MG tem em aumentar o potencial de contágio e de aumentar a incidência no município de Alfenas, pela volta dessa população de estudantes, do que a volta dos nossos universitários para Varginha e especialmente Poços de Caldas.”

Em relação à taxa de mortalidade, o epidemiologista chama a atenção para o indicador de Poços de Caldas. Se no que se refere à incidência acumulada, Poços de Caldas registra um ritmo menor de contágio, na taxa de mortalidade o número supera o da região. “No Sul de Minas, hoje nós temos para cada 100 mil habitantes, 269 óbitos por covid-19. Em Poços de Caldas esse valor é 304; em Alfenas 271. Muito semelhante ao valor do Sul de Minas; e em Varginha 260, um pouco abaixo do Sul de Minas”, aponta.

Segundo o professor, é preciso se atentar para a proporção de população idosa no perfil demográfico de Poços de Caldas, que é significativamente maior que em Alfenas e Varginha. Se entre a população idosa, existe maior risco de morte, municípios com maior proporção de idosos tendem a ter uma taxa de mortalidade também maior.

Em Poços de Caldas, o número de mortes em relação aos doentes é 3,4%, ou seja, a cada 100 habitantes, são registrados mais de três óbitos, o que pode ser influenciado pelo perfil demográfico do município que conta com grande número de pessoas idosas. (Foto: Reprodução/Internet)

Quanto ao indicador de letalidade, que aponta o número de mortes em relação aos doentes, para cada 100 doentes de covid-19, o Sul de Minas registra 2,3%. Em Poços de Caldas, esse número vai para 3,4%, o que segundo o professor Sinézio Silva, pode estar influenciado pelo número maior de idosos na cidade. Em Varginha, o percentual é de 1,9 e em Alfenas, 1,8, o que fica um pouco abaixo do índice da região que é 2,4%. “Em Alfenas, de cada 100 doentes, registramos quase duas mortes. Em Varginha, de cada 100 doentes, quase duas mortes e em Poços de Caldas, de cada 100 doentes, aproximadamente 3 mortes.”

A leitura feita pelo epidemiologista é que se um município apresenta uma letalidade menor, pode-se considerar que a qualidade da medicina intensiva está influenciando positivamente, que é o caso de Alfenas, por exemplo.

Sobre os indicadores de internações e óbitos, Prof. Sinézio Silva detalha que no Sul de Minas, o índice de internações está em 7%, o que significa que, de cada 100 casos, há registros de sete internações. Já o índice de óbito por internação (número de óbitos em relação ao número de internações) o Sul de Minas registra 30% — de cada 100 internações, acontecem 30 óbitos.

No indicador de internações, considerando toda pandemia, a cada 100 casos, foram registradas oito internações em Varginha. (Foto: Reprodução/Internet)

A cidade de Alfenas apresenta um pouco menos do que o Sul de Minas, em relação a número de internações por caso. “O Sul de Minas tem 7% de internação por caso, Alfenas tem 6%; Poços de Caldas têm 11%, então em Alfenas ao longo de toda a pandemia, de cada 100 casos, registramos seis internações. Em Poços de Caldas, de cada 100 casos, considerada toda a pandemia, registrou-se 11 internações; e em Varginha, de cada 100 casos, considerando toda a pandemia, nós registramos oito internações. Nesse indicador, por exemplo, Alfenas está um pouco melhor”, indica.

No que diz respeito ao índice de óbitos, que no Sul de Minas é 30%, Alfenas também registra 30%, Poços de Caldas, 29%, e Varginha, 23%. “Nós estamos acumulando dados em número, porque a Ômicron foi predominante em 100% das amostras genotipadas em Minas Gerais pela Secretaria Estadual de Saúde na última semana de 2021. Quando começamos a observar a curva, nós começamos a subir essa curva lá pelo dia 28 de dezembro, então nós temos aí uns 14 dias, que é um número interessante para analisar a pandemia”, diz.

No que diz respeito ao índice de óbitos, que no Sul de Minas é 30%, Alfenas também registra 30%, Poços de Caldas, 29%, e Varginha, 23%.

Fechando a análise, o epidemiologista comenta que nesse período de alta da variante Ômicron, os pesquisadores observam que para cada 100 casos, associam-se de uma a duas internações, o que demonstra uma proporção três vezes menor de internação, porém, a situação pode mudar se houver muitos casos.

“Menor percentual de internados está acontecendo em relação aos casos; só que se tiver muitos casos nós podemos ter muita internação e com muita internação, e aí tem o problema dos surtos de gripe também pela variante H3N2 Darwin, nós podemos ter de novo uma superlotação nos hospitais e a própria qualidade do atendimento fica complicada, isso se soma a profissionais que podem estar afastados pela doença e por esses motivos a morte por covid-19 pode aumentar”, alerta. “A epidemia se controla evitando casos novos”, conclui. 

Prof. Sinézio Silva é coordenador dos projetos “Perfil Epidemiológico e Indicadores de Saúde (Indcovid)” e “Informação sobre covid-19 para a comunidade (Infocovid)”. 

Acompanhe todos boletins epidemiológicos aqui.