Especial Abelhas: Em estudo sobre comportamento social das abelhas, pesquisadores da UNIFAL-MG identificam alterações no desenvolvimento cerebral de rainhas e operárias, em consequência da alimentação diferenciada das castas

De que forma ocorre o desenvolvimento no interior da abelha? Como a alimentação diferenciada entre as abelhas rainhas e as abelhas operárias pode alterar o tamanho e a organização do cérebro delas? Como os agentes externos, como pesticidas, podem influenciar esse processo? São perguntas como essa que guiam o trabalho do grupo de pesquisa “Biologia da Socialidade”, coordenado por Angel Roberto Barchuk, professor e pesquisador do Departamento de Biologia Celular e Desenvolvimento, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da UNIFAL-MG. Em mais uma reportagem da série especial sobre abelhas, conheça mais uma pesquisa da Universidade que vem alcançando resultados expressivos.

Angel Roberto Barchuk – professor e pesquisador do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB). (Foto: Arquivo/Dicom)

Para falar sobre os objetivos da pesquisa, que vem sendo nos Laboratórios do Departamento de Biologia Celular e do Desenvolvimento da UNIFAL-MG, o professor Angel Barchuk explica como é o funcionamento na organização social das abelhas. “Existem diferentes espécies de abelhas e cada uma delas possui sua particular forma de viver. Algumas são solitárias, outras vivem em pequenas colônias e outras formam colônias altamente organizadas, como as mandaçaias — Melipona quadrifasciata —, marmeladas amarelas —Frieseomelitta varia — e as africanizadas — Apis mellifera. Nestas últimas, um complexo sistema de sinalização garante que todas as fêmeas, exceto uma, se envolvam em atividades de manutenção da colônia, como construção de ninhos, criação de ninhadas, guarda e coleta de alimentos e água, as operárias”, contextualiza.

De acordo com o pesquisador, normalmente, uma única fêmea é elevada, junto aos zangões, para desempenhar as funções reprodutivas, conhecida como abelha rainha. “Esta ‘elevação ao trono’ é definida logo no início da vida destas fêmeas, enquanto ainda estão se desenvolvendo, no que é chamado estágio larval. Durante este período de desenvolvimento, longe ainda da vida adulta, as larvas dos dois tipos de fêmeas são alimentadas de maneiras bem diferentes”, comenta.

Pesquisadores em trabalho de campo. (Foto: Arquivo/Grupo de pesquisa)

As abelhas operárias recebem uma mistura de mel, polén e um pouco de geleia real, o que, conforme esclarece o professor Angel Barchuk, é bom, mas precisa ser digerido, o que dá trabalho para o corpo das operárias. Enquanto essas abelhas recebem esse alimento, a escolhida para tornar-se rainha recebe todo esse alimento, porém, já completamente processado, enriquecido de nutrientes e em grandes quantidades. 

“Como resultado, as fêmeas que recebem alimento não enriquecido crescem menos, desenvolvem ferrão e estruturas coletoras de pólen. As que são tradadas como rainhas durante o desenvolvimento, crescem mais e desenvolvem o sistema reprodutor equipadíssimo e um cérebro bem maior que o de operárias, tudo graças à diferença na alimentação recebida”, detalha, completando que o grupo de pesquisa investiga justamente os eventos moleculares desencadeados na abelha em desenvolvimento, como consequência da alimentação diferencial para rainhas e operárias.

Sob o título “Redes de expressão gênica responsáveis pela plasticidade do desenvolvimento cerebral em resposta a diferenciais nutricionais”, a pesquisa conta com uma rede multidisciplinar de pesquisadores para realização. São acadêmicos de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado, além de técnicos, professores e pesquisadores da UNIFAL-MG e de instituições de ensino superior do país e do exterior, como Argentina, Austrália e Estados Unidos. Os discentes de pós-graduação do grupo estão vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Biociências Aplicadas à Saúde (PPGB) ou ao Programa Multicêntrico em Ciências Fisiológicas (PPGMCF).

Acadêmico mostra quadro onde as abelhas armazenam os favos de mel.  (Foto: Arquivo/Grupo de pesquisa)

“A Biologia do Desenvolvimento, que seria a área do conhecimento onde se insere nossa pesquisa, é um espaço multidisciplinar, que inclui a visão morfológica, genética, molecular, bioquímica, evolutiva e, mais recentemente, bioinformática. Assim, para abordar nosso problema biológico, a influência ambiental sobre o desenvolvimento do cérebro, sempre tentamos fazer com que nosso grupo de pesquisa também seja multidisciplinar”, ressalta.

Os projetos de pesquisa recebem apoio de várias agências de fomento federais, estaduais e da própria UNIFAL-MG pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRPPG). Entre as agências, encontram-se: a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

Principais avanços das investigações científicas em relação ao comportamento e desenvolvimento das abelhas
Discente em laboratório realiza o dissecamento das abelhas. (Foto. Arquivo/Grupo de pesquisa)

Aspectos de como as abelhas se desenvolvem e como se comportam as diferentes castas — rainhas e operárias — são objeto de estudo do grupo de pesquisa “Biologia da Socialidade” há 20 anos. Experimentos que mostram o desenvolvimento diferencial do cérebro em resposta à nutrição diferencial foram iniciados há 10 anos. “Os últimos estudos sobre os aspectos moleculares responsáveis por mediar a ação nutricional sobre o desenvolvimento inicial do cérebro iniciaram há 3 anos, com a apoio do CNPq”, conta o professor Angel Barchuk.

Segundo o pesquisador, as investigações mostram que enquanto o desenvolvimento continua, o cérebro das operárias também segue se desenvolvendo e o das rainhas sofre uma parada. “Com isso, o cérebro das operárias adultas é proporcionalmente maior que o das rainhas”, acrescenta.

Ao longo dos anos, as pesquisas realizadas têm apontado importantes contribuições para o estudo das abelhas como a própria identificação das redes moleculares que respondem à alimentação diferencial e levam ao maior desenvolvimento cerebral. “Mostramos também que os microRNAs — pequenas moléculas de ácidos nucleicos —, presentes na geleia real consumida pelas abelhas em desenvolvimento, modulam a formação do cérebro”, conta Angel Barchuk.

Pupas em estudo no laboratório. (Foto: Arquivo/Grupo de pesquisa)

“Isto é bem relevante, porque os microRNAs são captados de plantas pelas operárias adultas durante o forrageamento [atividades realizadas na coleta de néctar e pólen], passados para as operárias e rainhas em desenvolvimento, nas quais governam a formação de diferentes órgãos, entre eles, o cérebro. Tudo isto, em conjunto, tem implicações tanto para a compreensão da biologia das abelhas quanto para o desenvolvimento e comportamento do próprio ser humano”, finaliza.

Para conhecer mais de perto o trabalho do grupo de pesquisa “Biologia da Socialidade”, acesse a página Biologia da Socialidade e siga o perfil no Facebook. 

O trabalho desenvolvido no laboratório também pode ser conferido no vídeo disponível neste link.

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