Documentário produzido pela UNIFAL-MG é selecionado para 5ª Mostra de Cinema de Fama; curta resgata a história da chegada de Furnas no município

O documentário “Fama, progresso represado”, produzido pela UNIFAL-MG, será exibido e lançado na 5ª Mostra de Cinema de Fama, no sábado (08/09), na Praça Central da cidade. A produção faz parte do Projeto de Extensão “Histórias de quando a água chegou”, iniciado em 2015, com o objetivo de estudar formas de trazer ao conhecimento da comunidade as memórias de pessoas que vivenciaram o período de construção da Represa de Furnas. Esta edição, que conta a história da chegada de Furnas em Fama-MG, começou a ser produzida em 2019 e tem duração de, aproximadamente, 33 minutos.

Profa. Flaviane Faria Carvalho, do Instituto de Ciências Humanas e Letras da UNIFAL-MG. (Foto: Arquivo Pessoal)

Sob a direção da professora Flaviane Faria Carvalho, do Instituto de Ciências Humanas e Letras (ICHL/UNIFAL-MG) o documentário foi desenvolvido, na época, pela bolsista Joyce Larissa de Souza Pereira, com a colaboração dos discentes Bruno de Souza, Giovanna Manfrinato e Fernanda Bernardes. No período, eles eram estudantes do curso de Letras da UNIFAL-MG.

Segundo a Profa. Flaviane Carvalho, é a primeira vez que o documentário é selecionado pela Mostra de Cinema de Fama. O curta faz parte da categoria competitiva “Mostra Mineira”, ao lado de outras obras sobre a cultura de Minas Gerais. De acordo com ela, a proposta do projeto foi contemplar cidades próximas à UNIFAL-MG que foram afetadas pela inundação provocada pela construção da represa de Furnas. Nesse sentido, a equipe escolheu as cidades Carmo do Rio Claro, Alfenas e Fama.

Bastidores da entrevista com Guilherme Prado, na casa do entrevistado, em Paraguaçu. (Foto: Arquivo Pessoal/Flaviane Carvalho)

Citando o pesquisador Antônio Ferreira Colchete Filho, a docente destacou: “Fama foi um dos municípios da região que mais sofreu prejuízos em termos sociais, econômicos e culturais resultantes da construção da Represa de Furnas. Vale sublinhar que 18,81% da área total do município, precisamente grande parte da sua área urbana, foi inundada”.

Além disso, a pesquisadora salientou que a proximidade geográfica com Alfenas – cidade onde fica a sede da UNIFAL-MG e na qual acontece a produção dos documentários – também foi um aspecto favorável para a escolha de Fama, já que algumas questões de logística, como deslocamento e custo de viagem, foram mais propícias para a realização das entrevistas, obtenção de materiais e captação de imagens da cidade.

Durante o processo de produção do documentário, a equipe seguiu algumas etapas. Primeiramente, os integrantes fizeram uma pesquisa para buscar nomes e contatos de pessoas que poderiam contribuir com depoimentos. Assim, com uso da pesquisa de arquivos e contato com pessoas ligadas de alguma forma com a história e cultura da região de Fama, o grupo chegou aos sete nomes que iriam compor o material do documentário por meio de testemunhos.

Bastidores da entrevista com Angelo Saksida (in memorian), na casa do entrevistado, em Fama. (Foto: Arquivo Pessoal/ Bruno de Souza)

Feito o contato com cada entrevistado, eles se deslocaram até o local para realizar a interação, geralmente nas próprias residências dos entrevistados, promovendo, assim, um ambiente em que o entrevistado se sentisse à vontade e propiciando uma situação de maior confiabilidade para que revelassem suas memórias.

No local da entrevista, o equipamento de captação de imagem e áudio foi montado e a entrevista foi conduzida de acordo com as perguntas a respeito dos pontos importantes para o tema central do documentário: como era a cidade de Fama antes da represa, o processo da inundação e outros pontos julgados relevantes pela equipe.

“Com os vídeos dos depoimentos em mãos, foi de suma importância a realização da decupagem como uma das etapas do processo. Dessa forma, foram selecionados os trechos mais significativos referentes à temática explorada para a montagem do documentário”, explicou. 

A coordenadora do projeto, professora Flaviane Carvalho, com o entrevistado José Lino (in memorian). (Foto: Arquivo Pessoal/Flaviane Carvalho)

De acordo com ela, a partir dos depoimentos, foi possível estabelecer os pontos mais relevantes conforme a recorrência com que eram citados, bem como o nível de detalhamento do relato e a forma como os fatos eram mencionados dentro de uma ordem cronológica em todas as entrevistas.

Feita a decupagem dos vídeos, o próximo passo foi montar a “colcha de retalhos”, encaixando os trechos das falas na ordem estabelecida de acordo com o conteúdo dos relatos. Uma vez montado o “corpo” do documentário, a etapa seguinte foi fazer a transcrição das falas de forma digital, que futuramente foi integrada ao vídeo na forma de legendas, muito importantes para a compreensão plena dos depoimentos por parte do espectador.

Professora Flaviane Carvalho com o entrevistado José Órfão (in memorian). (Foto: Arquivo Pessoal/ Flaviane Carvalho)

Depois de organizados os trechos de vídeos com os depoimentos devidamente legendados, a equipe preparou a edição final, que serve como um acabamento do produto final do projeto. Essa edição contou com a inserção de imagens para ambientação, trilha sonora, fotos, efeitos sonoros, observações escritas, tratamento de imagem e créditos finais, a fim de contribuir para a aproximação do espectador com o universo abordado pelo documentário. Além disso, a professora chama a atenção para a participação da escritora Isa Musa de Noronha, que narrou trechos de sua obra “Uma vida na linha”, de 2005, no início e no fim do documentário.

Isa Musa de Noronha é escritora da obra “Uma vida na linha”, narrada no início e fim do documentário. (Foto: Arquivo Pessoal)

“O texto, narrado por mim no documentário, conta as histórias de meu avô ferroviário. Minha família tem raízes na Fama, desde os tempos da navegação no Rio Sapucaí, pois meu tio avô Afonso Pereira era chefe da navegação; e o meu avô Antônio Musa, foi Chefe de Estação Ferroviária, minha tia, Zélia Cambraia, foi diretora e professora do Grupo Escolar. Guardo nas minhas memórias afetivas as mais ternas lembranças da ‘velha Fama'”, destacou Isa de Noronha.

Sobre a participação no documentário, a escritora completou: “Há tempos recebi ligação da Flaviane Faria Carvalho, que me falou do projeto e havia tomado conhecimento do meu livro. Fiquei honrada em participar desse trabalho que resgata as lembranças, as histórias de uma cidadezinha que as águas cobriram”.

Segundo a Profa. Flaviane Carvalho, com relatos da chegada das águas de Furnas na região de Fama, o grupo aprendeu sobre como era a vida social e econômica conduzida pela navegação a vapor às margens do Rio Sapucaí. “Conhecemos o drama deste município, onde boa parte de sua área urbana foi inundada, perdendo seus acessos e suas fábricas – mergulhando, assim numa profunda condição de desemprego e, consequentemente, abandono”, relatou.

“Nos emocionamos com a perda de parte da identidade e da memória afetiva de centenas de pessoas, já que nossa identidade também se constrói a partir das relações que estabelecemos com o espaço onde nascemos e fomos criados”, completou a docente.

A bolsista do projeto, Joyce Souza, no restaurante do entrevistado Mauro Rocha, ao lado de esposa. (Foto: Arquivo Pessoal/Flaviane Carvalho)

Na oportunidade, a professora contou que a equipe planejou o lançamento do documentário para 2020, mas suspendeu o evento por conta do início da pandemia. “Para a nossa tristeza, três entrevistados faleceram e não puderam assistir ao documentário finalizado: José Maria Lino, Ângelo Henrique Saksida e José Órfão. Acredito que, para a família deles, assistir ao lançamento deste documentário na 5ª Mostra Fama terá um significado ainda mais especial”, destacou.

A pesquisadora salientou, ainda, que o registro dessas histórias e a disponibilidade do acervo visual à comunidade acadêmica – por meio do canal do Youtube “Histórias de quando a água chegou” – poderá contribuir para futuros estudos nas áreas da literatura, história, sociologia, antropologia, geografia e para o desenvolvimento de novas linguagens, bem como outras ações de pesquisa, ensino e extensão.

Como contribuição à comunidade externa, a docente acredita que a produção desse registro ajuda a evitar que o passado e a identidade cultural de Fama e região sejam ainda mais apagados como o são até os dias de hoje. “Com essa contribuição para a cultura e história do município, podemos também colaborar para a preservação da memória de nossa região e para a formação da identidade social e cultural dos indivíduos pertencentes a ela”, frisou.

Para finalizar, a pesquisadora destacou a seleção do documentário para ser exibido e lançado na 5ª Mostra Fama como uma oportunidade de divulgação, para um amplo número de pessoas, de ações de extensão de qualidade desenvolvidas com o apoio da universidade pública.

Sobre o Projeto de Extensão

A construção da usina de Furnas, durante o governo JK, foi considerada por muitos fundamental para a industrialização do Brasil, que demandava o aumento da capacidade de produção de energia elétrica. Apesar disso, como consequência, a represa formada ao longo da década de 60 inundou cerca de 1.400 Km² de terras em 34 municípios do Sul de Minas Gerais. Desde então, o acontecimento tem gerado revolta, causando prejuízos às atividades econômicas desenvolvidas na região e transformando radicalmente a vida de centenas de mineiros.

Diante da necessidade de estudar formas de trazer à tona e ao conhecimento da comunidade as memórias de pessoas que vivenciaram o período de construção da Represa de Furnas, foi criado o Projeto de Extensão “Histórias de quando a água chegou”.

O projeto teve início em 2015, desenvolvido pelo egresso do curso de Letras, Paulo César de Carvalho, sob a orientação do professor Ítalo Oscar Riccardi Leon, do ICHL. Um dos resultados foi o documentário Antônio Adauto e os Índios, lançado em 2016, com enfoque em Carmo do Rio Claro.

A partir de 2017, o projeto passou a ser desenvolvido pela bolsista Joyce Larissa de Souza e coordenado pelos professores Flaviane Carvalho e Ítalo Leon. Em 2018, foi lançado o documentário Alfenas e suas memórias submersas, em comemoração aos 150 anos da cidade. A produção, que foi resultado do processo de Concessão de Bolsas a Programas e Projetos de Extensão – PROBEXT, contou com a colaboração dos docentes Eloésio Paulo, Marcos de Carvalho, Jéssica Frutuoso Melo e Wellington Ferreira Lima, do ICHL, assim como das então discentes do curso de Letras, Fernanda de Souza Fernandes, Maria Luiza Destro Silva e Anna Eliza Ananias Reis.

Finalmente, em 2019, teve início a produção do documentário Fama, progresso represado. O conteúdo completo está no canal do youtube “Histórias de quando a água chegou”. Até o momento, os documentários já foram assistidos por mais de 5 mil pessoas.

A 5ª Mostra de Cinema de Fama acontecerá de 6 a 9 de outubro. Confira a programação completa do evento, disponível no site: https://mostrafama.com.br/

*Jaíne Reis Martins é estagiária da Diretoria de Comunicação Social da UNIFAL-MG