Entrevista com Pesquisador: entrevista com o professor Ferrarezi Jr.

Dando continuidade ao projeto “Entrevista com Pesquisador”, hoje apresentamos uma parte da entrevista com o professor Ferrarezi Jr.

Confira abaixo a entrevista!!!

PET: Relacione sobre a área de aprendizagem, linguagem e cognição.

Ferrarezi: Hoje, sabemos que a linguagem não é um elemento acessório no funcionamento do cérebro, como se acreditou por muito tempo. Não é apenas “mais uma coisa qualquer” que aprendemos ao longo da vida. Ao contrário, a linguagem é essencial para o funcionamento do cérebro e é a partir dela que as demais aprendizagens ocorrem. Sem um componente linguístico bem desenvolvido quando a pessoa ainda é criança, ou seja, na época adequada (até os 10 anos, mais ou menos, sendo que os primeiros 6 anos são mais cruciais e determinantes), a pessoa terá dificuldades de aprendizagem por toda a vida. Logo, hoje sabemos o desenvolvimento correto da linguagem na época adequada é algo muito mais importante do que acreditávamos há 30 anos.

PET: Quando e como você se interessou por essa área de pesquisa?

Ferrarezi: Quando menino. Uma vez, quando eu tinha meus 12 ou 13 anos, tive uma briga com o professor de religião da escola porque eu dizia que a linguagem era mais importante que a religião e ele dizia o contrário. Ele ficou com tanta raiva de mim que me mandou para fora da sala… rsrsrsrsrsrs. Meu primeiro livro sobre a importância de linguagem para o desenvolvimento da mente foi escrito quando eu tinha 19 anos. Mas, é claro que, naquela época, não sabíamos nem 10% do que sabemos hoje sobre a linguagem. Entretanto, eu já estava metido nessa briga. Ou seja, é um amor de adolescente…

PET: Como era a realidade do ensino quando você começou a pesquisar sobre Aprendizagem, linguagem e cognição e quais as mudanças que vem ocorrendo?

Ferrarezi: Para ler, o único caminho era a Biblioteca. A gente contava com o que a universidade comparava e não era muito… Revistas científicas eram um luxo! Só havia umas poucas assinaturas, e tudo em português. Só quando entrei no Mestrado na Unicamp foi que consegui pegar uma revista científica estrangeira para ler. Não havia tomografia computadorizada (hoje, essencial para os estudos da neurologia) e a tecnologia disponível era muito rudimentar, se comparada à de hoje. Ou seja, a gente ralava dez vezes mais para aprender 10 vezes menos. Mas, a gente se esforçava tanto que acabava compensando. Por outro lado, hoje o mundo está na palma de nossas mãos e muita gente despreza essa facilidade. Uma pena!

PET: Em tempos de pandemia a única solução para a continuação das aulas é através do meio virtual. Há diferenças cognitivas no processo de aprendizagem em sala de aula e virtualmente?

Ferrarezi: Sim, há. Existem pesquisas que mostram que há diferença até na leitura no papel e na tela do computador/celular. O corpo humano sempre reage de formas diferentes a estímulos diferentes. Além disso, a EaD exige uma disciplina pessoal que a grande maioria dos brasileiros não tem. O sistema EaD é ótimo para quem tem disciplina pessoal, mas isso é raridade no Brasil. Por isso, a maioria dos alunos têm dificuldade no aprendizado EaD aqui, mesmo que o professor faça material específico. Ou seja, no que se refere aos temas escolares, o brasileiro – em geral – aprende melhor na presença do professor do que sozinho no quarto.

PET: A tecnologia tem uma grande importância hoje na vida do individuo, porém há muitos prós e contras, e com o ensino a distância hoje, as divergências aumentaram. Qual sua opinião a respeito dessa situação?

Ferrarezi: Nenhuma forma de ensino pode substituir a forma presencial, o “olho no olho”, a cumplicidade que a presença dos alunos e dos professores em uma sala proporciona. Porém, estamos em uma situação de “guerra”, uma situação emergencial e excepcional. Então, temos que recorrer ao que temos, mesmo que não seja o ideal. Alguns aprenderão mais, outros menos. Isso dependerá mais do indivíduo do que do professor. Porém, devemos encarar isso como uma fase transitória. Até quem aprender menos estará, ainda assim, aprendendo algo, e isso é melhor do que nada. Em breve, creio, voltaremos para a forma ideal e nem lembraremos mais desse interstício trágico.

Vídeo do nosso bate-papo: